domingo, 24 de fevereiro de 2008

Cap.1 Doutrina Espírita: Allan Kardec e as Obras Básicas

1.1 - Introdução
Os factos atinentes às revelações dos Espíritos ou fenómenos mediúnicos remontam à mais recuada antiguidade, sendo tão velhos quanto o é o nosso mundo. A História, a este propósito, encontra-se cheia desses fenómenos de comunicação espiritual. A respeito destes fenómenos, muitos homens ilustres manifestaram-se favoravelmente, tais como: Sócrates, Platão, Pitágoras, Empédocles, Apolónio de Tiana, Buda, Hermes Trimegisto, etc.
As evocações de Espíritos sempre existiram, tanto no Ocidente como no Oriente, como se pode concluir pelos relatos do Código dos Vedas e do Código de Manu.
Paulo, o Apóstolo, em suas cartas, reconhecia a prática das manifestações espirituais, alertando-nos desde logo quanto à procedência dessas comunicações. Na Idade Média, destaca-se a figura admirável de Joana D'Arc, a grande médium, que se recusa sempre a renegar as vozes espirituais.
1.2 - Precursores Imediatos:
Só numa época mais moderna é que podemos melhor situar a fase precursora do Espiritismo. A diferença entre os factos desta fase e os fenómenos da "Pré-História", como bem acentua Arthur Conan Doyle, está em que estes últimos episódios eram esporádicos, sem que existisse uma sequência metódica, enquanto que aqueles têm a característica de uma "invasão organizada". É nessa época mais moderna que vamos encontrar alguns notáveis antecessores do Espiritismo, como o famoso clarividente sueco, Emmanuel Swedenborg, dotado de largo potencial de forças psíquicas.
Um outro notável precursor foi Andrew Jackson Davis, magnífico sensitivo e considerado como “O Profeta da Nova Revelação”.
1.3 - Os Fenómenos Hydesville e as Mesas Girantes.
Hydesville era uma pequena cidade no interior do estado de Nova Iorque, nos Estados Unidos.
Poucas casinhas de madeira, alguns estabelecimentos comerciais e muita calma. Até que se transfere para lá, no ano de 1846, a família Fox. O primeiro ano da família Fox em Hydesville decorre sem incidentes, embora vez por outra, observassem ruídos estranhos à semelhança de "arranhaduras" nas paredes. Em meados de Março de 1848, tais ruídos atingiram proporções gigantescas: pancadas, arrastar de móveis e tremores nas camas. A família estava decidida a mudar-se, quando na noite de 31 de Março de 1848 (data que os americanos consideram como de fundação do “Novo Espiritualismo”), a menina Kate, de 11 anos, decide "interrogar as pancadas".
Diz: “- Senhor Pé Rachado, faça o que eu faço.” e bateu 3 palminhas.
Imediatamente ouviu 3 pancadas.
Margarete, sua irmã de 14 anos, achou interessante e disse:
"Agora sou eu; faça assim." E bateu 4 palmas. Quatro pancadas ressoaram.
A partir daí centenas de pessoas foram chamadas a presenciar o fenómeno e, através de um alfabeto, representando as letras através de pancadas, eles descobriram que estavam conversando com
um "morto". Chamava-se Charles Rosnan, havia sido assassinado naquela casa há 5 anos. Indicou o local onde seu corpo estava enterrado, o que posteriormente foi confirmado.
Os fenómenos de Hydesville, abriram a porta para muitos outros, que levou Conan Doyle a
considerá-los "Como a coisa mais importante que deu a América para o mundo."
Após os acontecimentos de Hydesville, tornou-se "a coqueluche da sociedade francesa", aquilo que ficou conhecido com o nome de Mesas Girantes.
Consistiam em mesas comuns, de madeira, de três pés, onde as pessoas se sentavam em torno para dialogarem com os Espíritos. Utilizando-se de recursos mediúnicos de uma ou mais das pessoas presentes, as entidades desencarnadas (espíritos), através de pancadas nas mesas ou movimentos, respondiam inteligentemente às perguntas dos curiosos.
Informam-nos os historiadores que nos anos de 1853 a 1855, as mesas girantes constituíam, em Paris, verdadeiros passatempos, sendo diversão quase obrigatória nas reuniões sociais.
Todavia, ninguém poderia imaginar que dessa brincadeira de salão brotaria o impulso inicial para a Codificação do Espiritismo.

1.4 - Allan Kardec
1.4.1 - O Homem
Na cidade de Lion, em França, nasceu no dia 3 de Outubro de l804, aquele que se celebrizaria sob o pseudónimo de Allan Kardec. De tradicional família francesa de magistrados e professores, filho de Jean Baptiste Antoine Rivail e Jeane Louise Duhamel, foi batizado com o nome de Hippolyte Léon Denizard Rivail.
Em Lion fez os seus primeiros estudos, seguindo depois para Yverdon, na Suíça, a fim de estudar no Instituto do célebre professor Pestalozzi. O instituto desse abalizado mestre era um dos mais famosos e respeitados em toda a Europa. Desde cedo Hippolyte Léon tornou-se um dos mais eminentes discípulos de Pestalozzi, estando inclusive, com a idade de 14 anos, ensinando aos condiscípulos menos adiantados, tudo o que aprendia.
Concluídos os estudos em Yverdon, regressou a Paris, onde se tornou conceituado mestre não só em Letras, como na Ciência, distinguindo-se como notável pedagogo e divulgador do Método Pestalozziano. Conhecia diversas línguas, entre elas o italiano e alemão, tendo traduzido várias obras para o francês. Contraiu matrimónio com a professora Amelie Gabrielle Boudet, conquistando nela uma preciosa colaboradora. O casal não teve filhos.
Como pedagogo, Rivail publicou numerosos livros didácticos. Apresenta na mesma época, planos e métodos referentes à reforma do ensino francês.
1.4.2 - O Codificador
Começa a missão de Allan Kardec quando, em 1854, ouviu falar pela primeira vez nas mesas girantes através do amigo Fortier, um pesquisador emérito do Magnetismo (Kardec a época interessava-se também pelo estudo desta ciência). Em princípio, Kardec revelou-se céptico, face à sua posição de livre pensador, de homem austero, sincero e observador. Exigindo provas, mostrou-se inclinado à observação mais profunda dos ruidosos factos amplamente divulgados pela imprensa francesa.
No ano seguinte, 1855, aceita o convite para assistir a uma sessão de mesas girantes, e vendo o fenómeno, interessa-se por este profundamente. Vê ali um fenómeno inusitado que deveria merecer um exame cuidadoso. Ele decide então, aos 51 anos de idade, estudar o fenómeno mediúnico. Passa a frequentar a residência de diversos médiuns, recebe cadernos contendo anotações de mensagens recebidas anteriormente, discute, analisa, apresenta questões de grande profundidade aos Espíritos, convencido que está da realidade do mundo extra físico.
O grande material estudado por ele, mais as centenas de questões propostas às Entidades Luminosas, deram condições ao professor Rivail de publicar a sua primeira obra, O Livro dos Espíritos, em 18 de Abril de 1857. Esta data passou a ser considerada como a de fundação do Espiritismo.
Decide adoptar o pseudónimo de Allan Kardec por dois motivos: primeiro para que o seu nome real, conhecidíssimo em Paris, não viesse a interferir na grandeza do livro, que segundo ele, deveria florescer pelo seu valor e, não pelo autor que o subscrevia. Segundo, em homenagem a uma existência que ele tivera nas Gálias, no primeiro século antes de Cristo, onde fora um sacerdote druida denominado Allan Kardec.
Fundou em l de Janeiro de 1858 a Revista Espírita, órgão mensal que deveria assumir um papel importantíssimo na divulgação da Doutrina, e no mesmo ano, no dia 1º de Abril, ele funda a primeira sociedade espírita com o nome de Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas. No dia 15 de Janeiro de
1861 lança O Livro dos Médiuns, e depois, sucessivamente, O Evangelho Segundo o Espiritismo, O Céu e o Inferno, e A Génese .
Kardec vem a deixar o mundo físico na manhã do dia 31 de Março de 1869, em função da ruptura de um aneurisma cardíaco.
1.5 - As Obras Básicas
O conteúdo das obras publicadas por Allan Kardec expõem e consolidam os princípios e os elementos constitutivos da Doutrina Espírita, em toda a sua totalidade, segundo o ensino dos Espíritos, sistematizados pelo codificador. Representam um património ético, científico e filosófico de valor incalculável, pois traduz o esforço concentrado de uma imensa falange de Espíritos sábios e bons, que sob a assistência amorosa de Jesus acompanharam o trabalho incansável de Allan Kardec.
Constituem, na realidade, o alicerce insuperável, através do qual informações outras, de autores recentes, vão sendo paulatinamente assimiladas.
Emmanuel, examinando a grandiosidade das obras básicas do Codificador assevera:
"Após dezanove séculos de teologia arbitrária, não chegaríamos a compreender o Evangelho e Jesus Cristo, sem Allan Kardec."
As obras básicas da Codificação são as seguintes por ordem cronológica de edição:
1. O Livro dos Espíritos - 18 de Abril de 1857
2. O Livro dos Médiuns - Janeiro de 1861
3. O Evangelho Segundo o Espiritismo - Abril de 1864
4. O Céu e o Inferno - 1865
5. A Génese, os milagres e as predições - Janeiro de 1868
Allan Kardec escreveu ainda dois outros livros de menor extensão: “O Que é o Espiritismo” e “O Principiante Espírita”, e no ano de 1890, P.G. Leymarie publica o livro Obras Póstumas, contendo artigos de Kardec ainda não conhecidos do público.
1.5.1 - O Livro dos Espíritos
A primeira obra publicada por Kardec é, na essência, um tratado de perguntas e respostas de carácter filosófico. Em 1019 itens, o Codificador apresenta os princípios basilares da Doutrina que, posteriormente, serão desenvolvidos nos outros livros.
Na primeira parte: o autor estuda as causas primárias, Deus, o espírito e a matéria. O princípio vital e da criação.
Na parte segunda: o Mundo dos Espíritos; a encarnação, a desencarnação, a missão e ocupação dos
Espíritos e seu inter- elacionamento com os homens.
A terceira parte tem um carácter eminentemente moral, pois Kardec vai examinar a Lei Natural, subdividida em dez Leis Morais que regem as relações humanas: Adoração, Trabalho, Reprodução, Conservação, Destruição, Sociedade, Progresso, Igualdade, Liberdade e Justiça, Amor e Caridade.
Na última parte, o codificador preocupa-se com as Esperanças e Consolações e a Lei de Causa e Efeito.
1.5.2 - O Livro dos Médiuns
O segundo livro, por ordem cronológica de lançamento, no seu frontispício, apresenta o subtítulo:
"Guia dos Médiuns e dos Evocadores" e resume o seu conteúdo assim:
"Ensino especial dos Espíritos sobre a teoria de todos os géneros de manifestações, os meios de comunicação com o mundo invisível, o desenvolvimento da mediunidade, as dificuldades e os tropeços que se podem encontrar na prática do Espiritismo."
O Livro dos Médiuns é considerado, ainda hoje, como o mais completo tratado de fenomenologia paranormal de todos os tempos, e, por esse motivo, é de leitura obrigatória a todos aqueles que trabalham na área mediúnica.
1.5.3 - O Evangelho Segundo o Espiritismo
Com esta obra, o Espiritismo vai assumir um carácter nitidamente religioso, pois Kardec se propõe a examinar cuidadosamente as diversas palavras do Cristo e as passagens mais significativas do Novo Testamento, no seu aspecto moral.
Em sua folha de rosto, lê-se a síntese do seu conteúdo:
"A explicação da máximas morais do Cristo em concordância com o Espiritismo e as suas aplicações às diversas circunstâncias da vida."
O seu estudo se desdobra em 28 capítulos de rara beleza e de profunda sabedoria.
1.5.4 - Céu e o Inferno
Este quarto livro tem como subtítulo "A Justiça Divina segundo o Espiritismo."
Na primeira parte: Céu, Inferno, Anjos e Demónios, e a Lei de Acção e Reacção mostrando as inúmeras nuances que cercam este princípio universal.
Na segunda parte, apresenta o Codificador mensagens de Espíritos desencarnados que se comunicaram na Sociedade Espírita de Paris.
1.5.5 - Génese, os Milagres e as Predições segundo o Espiritismo.
Um ano antes da sua morte, Allan Kardec publicou seu último grande livro. Cabia-lhe interpretar o Antigo e o Novo Testamento segundo a ciência espírita. Nas primeiras linhas da introdução, escreveu:
"A nova obra constitui mais um passo à frente, nas consequências e nas aplicações do Espiritismo; tem por fim o estudo de três pontos que foram até hoje, diversamente interpretados e comentados: A Génese, os Milagres de Jesus e as predições encontradas nos Evangelhos."
1.6. Princípios básicos da Doutrina Espírita:
A força da Doutrina Espírita encontra-se nos seus princípios e na sua permanente possibilidade de comprovação. São eles: A existência de Deus;
A imortalidade;
A comunicabilidade dos espíritos;
A reencarnação e a evolução universal e infinita.
Cada um destes princípios será objecto de estudo nos próximos capítulos.

Bibliografia e referências
a) Allan Kardec (Volume I, II e III) - Zêus Wantuil e Francisco Thiesen
b) O Evangelho segundo o Espiritismo - Introdução - Allan Kardec
c) Obras Póstumas - Allan Kardec
d) As Mesas Girantes - Zêus Wantuil
e) A História do Espiritismo - Arthur Conan Doyle